Paulo Luiz de Souza: Marcelo,no que tange a literatura mundial hoje, como você vê a situação do escritor brasileiro?
Marcelo Ariel: A situação do escritor brasileiro é a de um refém dos vampiros da esfera dos negócios culturais, as editoras nesse caso representam o mesmo que os senhores feudais, existem as pequenas editoras que vivem à margem do mercado, quase-invisíves e obscuras e elas representam o mesmo que a reforma luterana para a igreja católica, mas tudo isso pode ser um delírio a la Thomas Morus, a questão é que o artista em geral quanto mais rebelde, inadequado e estranho ao mercado, mais próximo se torna da dimensão do espírito ou seja da dimensão dos valores morais de uma interioridade, ela é talvez a única coisa capaz de resgatá-lo do vampirismo mercantil que é a base da sociedade do espetáculo.
Na esfera dos negócios o espírito não entra e vice-versa.
Paulo Luiz de Souza: Trazendo essa situação para o âmbito local, como se resolveriam as dificuldades?
Marcelo Ariel: Talvez, desvinculando totalmente a criação artística dos poderes empresariais e municipais. O que temos em Cubatão é um verdadeiro "Maraca Cultural" ( O Maraca era a antiga zona de prostituição da cidade, hoje um reduto industrial, o que diz muito sobre a situação). Por exemplo,os artistas do teatro sonham com situação de "funcionários" dos músicos da banda sinfônica, álias, uma das melhores do país, fundada na época da ditadura militar e existe o perigo dos escritores locais cairem no mesmo abismo da dependência da classe política ou da classe empresarial, que não possuem nenhum compromisso com a verdadeira função social da arte, que é despertar a consciência e a revolta contra o mercado e o Estado, entes absoletos que só existem por causa da escravidão conceitual na qual vivemos, principalmente em Cubatão.
Paulo Luiz de Souza: E com o advento da internet, o que se faria para formar novos leitores?
Marcelo Ariel: O leitor de textos da internet e o leitor dos livros jamais serão o mesmo leitor, o livro exige uma outra exploração do tempo psicológico que é quase eliminado ou drasticamente modificado pelo uso da internet, que dilui o tempo psicológico do mesmo modo que as drogas alucinógenas mais leves ou os sonhos lúcidos.Para formar novos leitores seria interessante a criação de bibliotecas nas esquinas de todos os bairros e que estas bibliotecas funcionem até as 22hs e a distribuição gratuita de livros clássicos, revistas e gibis como parte da cesta básica ou esmola dos governos, essa necessária e urgente mas não aprofundada "bolsa família" e congêneres.
Paulo Luiz de Souza: A literatura na sua forma escrita ainda interessa aos jovens?
Marcelo Ariel: Os jovens desprovidos da consciência da finitude e vítimas da ansiedade ou da depressão social ou da peste consumista, da peste das drogas ( Ver o Crack nas esquinas) e equilibristas dos vazios interiores, barcos bêbados da internet ou viciados na simulação de atividade dos games,estes precisariam nascer de novo através do exercício do diálogo socrático,leituras aprofundadas e etç...
São vítimas da falência educacional e cultural, principalmente em Cubatão.
Paulo Luiz de Souza: E os professores?
Marcelo Ariel: Em sua maioria são analfabetos funcionais, mas as exceções existem, eu mesmo fui salvo por uma professora, Dona Marlene, uma vizinha minha que me ensinou a ler e escrever e graças aos céus não era professora de nenhuma escola municipal ou estadual. Acho que deveríamos procurar exceções como ela na rede pública, existem? Pessoas com a verdadeira vocação para o diálogo com o outro. Para você ter uma idéia, os livros do meu antecessor Afonso Schimidt não são lidos nas salas de aula, eu disse lidos e não "leitura obrigatória", porque isso é um resquício da ditadura, muito do atraso cultural e social não passa de resquício da ditadura e ainda tem gente que sente nostalgia por "aqueles tempos".
Paulo Luiz de Souza: Você buscaria meios de fazer o seu livro Tratado dos anjos afogados circular no meio estudantil da nossa cidade? Com que interesse?
Marcelo Ariel: Sim, desde que isso não se reverta em "barganha política" com fins de lucro pessoal ou coletivo, como quase tudo nesta cidade.Meu livro está cadastrado nos ítens de compra do poder municipal desde 2008 e eu mesmo doei um exemplar do Tratado dos anjos afogados para a biblioteca.
Paulo Luiz de Souza: Nesses últimos anos parece haver um modismo de lançamentos de peças literárias ( livros), aqui na nossa cidade e tenho observado que muitas dessas peças tem pouco ou quase nenhum valor literário, pois o enfoque, na minha opinião sequer atinge o objetivo proposto,o que você acha disso?
Marcelo Ariel: Peças literárias...A expressão me lembra o universo da zona industrial e não a dimensão da cultura, ora a literatura possui uma expressão social que pode infelizmente ser reduzida ao nível das barganhas políticas ou simplesmente comerciais onde o lucro é mais importante do que a transmissão do conhecimento, muito grupos, ditos literários ou culturais, no fundo são grupos de auto-ajuda e embora cumpram bem a função social de "dar voz" , não estão interessados no jogo socrático ou na literatura como expressão da indignação ou
luta social, é o campo do entretenimento, da vaidade e do beletrismo ou seja a mais pura merda ontológica.
terça-feira, 18 de agosto de 2009
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ahhh! se todas as pessoas fossem como o Mar...ahhh! se ao menos, todos os poetas fossem como o Mar...estaríamos bem melhores!
ResponderExcluiramo-te, querido!!
beijo